VillaseGolfe
· Design · · T. Maria Cruz · F. Nuno Almendra

Inêz Fino

«Os clientes querem as nossas ideias mais extravagantes»

Villas&Golfe Pub. PUB HOMES IN HEAVEN Pub.
Vidago Villa Pub.
PMmedia PUB Pub.
Aprendeu a falar português em casa, com os pais e os avós, sem nunca ter uma aula. Nasceu em Portugal, mas foi na Grã-Bretanha que viu a sua juventude passar. Estudou no colégio interno New Hall School e formou-se em Design de Interiores na Regent Academy, em Inglaterra. Regressou à terra que a viu nascer aos 23 anos. A partir daí a vida fez-se de avanços e recuos. E o sorriso no rosto diz-nos que é feliz. Mas também atravessou os seus tempos incertos. Com a pandemia viu-se obrigada a reduzir os custos do atelier, a pensar de forma diferente, a trabalhar mais em outsourcing. Mas, felizmente este ano os projetos ressurgiram em força. Inêz gosta muito do que faz. Gosta de rabiscos. Gosta de mostrar aos clientes o seu pensamento, para que acompanhem cada momento do processo. Depois passa do desenho, das amostras, para a ‘coisa’ real. E é aqui que se fascina com os resultados. À Villas&Golfe falou da sua infância, do início da sua carreira, dos projetos, da COVID e do universo do design de interiores

Quem é a Inêsz Fino?
Já mudei muito durante a minha vida. Era muito vibrante, muito outgoing [extrovertida] mas, com as pancadas da vida, fui mudando. Hoje em dia sou uma pessoa muito mais relaxada. Sou outgoing, mas mais até no sentido de ser uma out of the box thinker [pensador fora da caixa], levo uma vida mais calma, embora esteja sempre a correr, sempre muito ocupada. Sou muito dada, muito sorridente, às vezes muito séria, porque gosto de ouvir e de apreciar.

E esse pensamento ‘fora da caixa’ sempre foi bem recebido nos projetos de interiores?
Sim. Os clientes querem as nossas ideias mais extravagantes. Às vezes chegam-nos com peças e dizem «quero isto, mas diferente», e eu dou as minhas ideias mais ‘fora da caixa’. Há dias uma cliente mostrou-me uma mesa em mosaico, antiga, fina, estávamos a preparar uma zona da sala grande, então sugeri fazer outras mesas, para completar com as coras brincalhonas que os mosaicos têm, e adaptamos àquela existente, e resultou muito bem. Uma forma de aproveitarmos aquela peça. São este tipo de ‘criatividades’ que o cliente espera de nós.

E no campo pessoal, pensar ‘fora da caixa’...
Falando de decorações, no campo pessoal, levo anos a fazer as minhas casas. Já vivi em várias. Estou farta de mudar na minha vida (risos), mas a verdade é que não é a mesma coisa que fazer um projeto para um cliente. Eu gosto de ir apreciando cada cantinho da minha casa, cada material que existe e vou questionando «isto fica bem com esta coleção nova? E que tal pintar a porta de azul cinzento? E se...»

A mãe, a avó, sempre tiveram o gosto para a decoração. A mãe, pelo que sabemos, foi uma das primeiras a tirar o curso de Design de Interiores. A Inês também tinha de seguir a área dos interiores...
Quando somos pequenos e crescemos com a mãe a mudar as coisas lá de casa, a fazer mudanças, e a perguntar «acha que este móvel fica bem ali, etc.»; que me levava às fábricas com ela, à Viúva Lamego, onde via as prisioneiras a pintarem os azulejos; depois escolhíamos os tecidos que trazíamos de Inglaterra... era inevitável seguir este caminho. E eu divertia-me imenso. Portanto, sou isto [designer de interiores] deste pequenina, com a minha mãe, e, às vezes, com a minha avó. Dos dois lados da família.

No campo profissional, conta com 26 anos de experiência. Que bagagem traz?
Quando acabei o curso em Inglaterra, voltei para Portugal e procurei trabalhar como designer de interiores, na altura, havia uma mão cheia de designers já reconhecidas, que eu conhecia muito bem, porque ou tinham estudado com a minha mãe – que também estudou Design de Interiores –, ou eram amigas pessoais. Fui ter com todas elas, mas diziam-me: «Inês, não me importo que venhas trabalhar comigo, mas não te consigo pagar, terá de ser tipo um estágio, não remunerado». A verdade é que eu tinha acabado os estudos e queria ganhar dinheiro, nem que fosse o mínimo. Então fui para uma área completamente diferente, para Artes, como professora, no São Domingos de Rana, e fiquei lá um curto período. Entretanto, fui convidada pela Adelaide Rebelo de Andrade, que precisava de ajuda no atelier dela, e acabei por trabalhar em projetos muito giros, desde hotéis, casas de famosos, políticos. Aprendi muito. Tratava de fornecedores, falava com clientes, ouvia as histórias deles, porque são as histórias deles que nós passamos para os interiores. Ainda hoje trabalho com famosos, nomeadamente futebolistas – são mais divertidos, mais ‘fora da caixa’.

O que representa para si cuidar dos interiores das casas das pessoas?
Cada projeto leva de mim um carinho imenso, porque estou a cuidar do bem-estar de pessoas que confiam em mim. Dedicarmo-nos a 100% ao projeto e ao caracter de cada cliente é compensador.

«Gosto de pôr o espírito do cliente no projeto e não o meu»
Leva muito em consideração o gosto do cliente?
Estive sete anos em Angola e há uma coisa que aprendi: devo pôr de parte o meu gosto. Os clientes têm a sua visão e os seus sonhos. Peço-lhes que tomem nota de tudo o que tem significado pra eles (um passeio, um restaurante, um hotel, uma fotografia...), porque gosto mesmo de pôr o espírito do cliente no projeto, não o meu.

Dos anos passados na Grã-Bretanha, o que guarda na memória?
Nasci em Portugal e fui viver para a Grã-Bretanha depois do 25 de Abril. O meu pai foi para lá assegurar uma fábrica da família. E fiquei lá até aos meus 23 anos. Tudo me marcou. Acho que os anos mais intensos na vida de uma pessoa são os mais novos, quando estamos a crescer. Tenho família de amigos lá, crianças com quem eu brincava, sorria, estudava, era tudo muito intenso. Adoro pensar nos passeios que fazíamos. Passeávamos de barco nos canais, visitávamos castelos, vilas, como a de Shakespeare, íamos a feiras de antiguidades. O meu pai adorava antiguidades. E em Inglaterra havia das exposições de antiguidades mais incríveis que possamos imaginar, eram em manor houses antigas, por exemplo. Tenho imensas saudades disso.

O facto de ter visitado essas feiras, esses palácios, traz-lhe inspiração?
Tive a sorte de nascer numa família que tinha, até aos meus 15 anos, grandes casas – depois tiveram de as vender –, vivi no Palácio Ratton, que era da minha avó,  onde brinquei por todas aquelas salas. Tinham aquele cheiro a madeira em todo o lado, as pratas muito polidas, as almofadas muito arrumadinhas. Isso cresceu comigo. A casa do Monte da Penha também era a casa de verão dos meus avós. Tinha isto dos dois lados da família, sempre vi a minha avó, a minha tia, a fazerem muita decoração, a envolverem-se em projetos. Cresci com isso. Para mim, é tão natural começar a visionar um cenário para uma pessoa e fazer daquilo algo muito especial, como alguém que sabe escrever muito bem, sabe fazer poemas ou escrever um livro.

Continua a passar essa vivência da infância para os seus projetos?
Sem dúvida. Acabei por ficar com um olho clínico mais apurado. Qualquer coisa que esteja fora do sítio, um laço mal feito, por exemplo, isso incomoda-me. Tenho de ter tudo na perfeição. 

Gosta do que é tradicional, ou sente que os tempos de hoje nos obrigam a ser mais ‘modernos’?
Eu sou tradicional de origem. Pelos sítios onde vivi, pelo que aprendi, até no colégio interno, New Hall School, onde andava em artes, aquilo era um palácio que Henrique VIII deixou para Anne Boleyn, é um bocadinho como Hogwarts, do Harry Potter. Venho de uma veia clássica, mas obviamente, hoje em dia, toda a gente quer o moderno. Eu faço o que o cliente quer. Tenho de fazer moderno. Mas gosto muito de fazer misturas, em vez de uma casa totalmente clássica, faço dela moderna, mas com pormenores pontuais de peças mais antigas, por vezes peças de heranças, que as pessoas têm, mas nem sabem o que lhes fazer.

Em que altura da sua vida sentiu necessidade de criar a Inês Fino?
Sempre quis criar a Inês Fino, mas a minha educação obrigou-me a ir em busca de experiência. Experiência foi a coisa mais importante para mim. Trabalhar com a designer que mencionei em cima foi o suficiente para entender o mercado. Entretanto, senti falta de aprender mais e voltei para Inglaterra, para trabalhar com outros profissionais, e depois acabei por passar sete anos em Angola, onde, primeiro trabalhei para uma empresa que estava a fazer vários hotéis. Entretanto, o meu namorado na altura aconselhou-me a criar o meu atelier. Eu já ia fazendo projetos para amigos, familiares, e em Angola surge a vontade de criar a Inêz Fino.  

«Eu sou tradicional de origem»
Como foi a experiência em Angola?
Embora sempre tenha trabalhado com estrangeiros, e estou habituada a isso, em Angola eles têm outra maneira de trabalhar, que não é a maneira europeia. Eles ou querem tudo e na mesma hora, ou então demoram muito tempo a tomar uma decisão. Acabei por fazer vários projetos lá, uns até foram pagos e não foram para a frente. A engenheira Albina Assis, na altura, foi-me buscar para trabalhar na decoração do pavilhão de Angola em Milão, isso foi uma experiência profissional extraordinária.

Quais os projetos que mais a marcaram?
Já fiz muitos projetos com os quais não me identificava pessoalmente, mas lá está, não tenho que me preocupar comigo, tenho que me preocupar com o cliente. O cliente é que vai viver naquela casa. Os mais marcantes foram projetos como a decoração do Palácio de São Bento, na altura em que António Guterres era primeiro-ministro. E mais recentemente o que fiz para um futebolista, que foi muito interessante e divertido.

Atualmente está com algum projeto em mãos?
Estou com uma casa de uns clientes estrangeiros. Trabalho muito com estrangeiros, trabalho com advogados, consultoras, que trazem para cá estrangeiros para investir, esse é o meu mercado. Obviamente também trabalho com portugueses, embora projetos mais pequenos. Depois da COVID-19, este ano, têm chegado muitos pedidos para projetos. As pessoas perceberam que querem viver em casas com jardim, receber ar fresco.

«Venho de uma veia clássica, mas obviamente, hoje em dia, toda a gente quer o moderno»

Nos últimos dois anos, a propósito do crescimento imobiliário, tem existido maior procura por interessados em projetos de design de interiores?
Para mim não. Aliás, tive de reduzir o meu gabinete. Embora hoje continue a trabalhar com o meu pessoal, e até com mais, mas em outsourcing, tive de reduzir muito os custos, porque os contratos que eu tinha, nomeadamente na hotelaria, e casas para alugar, esses pararam todos, porque os clientes queriam ver o que ia acontecer ao mercado. Eu fiquei um pouco aflita, nessa altura. De repente, este ano, tem havido um boom de estrangeiros a virem para cá e a pedir coisas. Neste momento, não tenho mãos a medir. Estou a fazer uma casa na Quinta da Beloura, para uns clientes de Singapura que vêm viver definitivamente para Portugal. Além disso, tenho um apartamento em Belém, uma casa no Belas Clube de Campo, entre outros. Estou a reabilitar-me.
https://www.youtube.com/watch?v=DkvvFhcb41I
Maria Cruz
T. Maria Cruz
F. Nuno Almendra
Política de Cookies

Este site utiliza Cookies. Ao navegar, está a consentir o seu uso. Saiba mais

Compreendi